Foram 36 horas de viagem, desde Crato, no Ceará, até a capital do Brasil, no Planalto Central. Aos 76 anos, Dona Teca não precisou de muitas palavras para justificar o motivo da jornada. “A gente vem por reparação e bem-viver e luta por justiça por este país, pela vida negra”, explicou. A seu lado, sua filha, Samara Alves Elpídio, acrescentou que estar ali, ao lado de outras milhares de mulheres, era também um posicionamento contra o racismo. “Nossos representantes têm que estar aqui para se posicionarem e verem de perto a realidade de cada uma”, disse Samara.
As palavras de mãe e filha do Ceará receberam o reforço de Juliana Sobreira, que deixou a cidade de São Paulo para se juntar a suas companheiras na 2ª Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver, realizada nesta terça-feira, 25 de novembro, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília. “A gente está aqui para não deixar apagar nossos direitos e garantir que as crianças negras cresçam sabendo que temos uma posição, um direito e um lugar”, afirmou Juliana.
Dez anos após a histórica marcha de 2015, a capital voltou a amanhecer tomada pela presença e pela força política das mulheres negras, vindas de caravanas de todas as regiões do Brasil e reforçadas por representações de mais de 40 países. A mobilização autônoma, que contou com investimento de R$ 1,7 milhão do Governo do Brasil, por meio do Ministério da Igualdade Racial (MIR), foi organizada pelo Comitê Nacional da Marcha das Mulheres Negras e integra a Semana por Reparação e Bem Viver, iniciada em 20 de novembro e que se encerra nesta quarta-feira (26).
“A presença do Ministério da Igualdade Racial aqui simboliza uma ponte entre movimento e Estado. Permaneceremos avançando, marchando por um bem-viver e por reparação. Por todas as mães que perderam seus filhos e por todas aquelas que vieram antes de nós. Seguimos juntas em marcha, na positividade, hoje e sempre”, afirmou a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. O investimento feito pela pasta ajudou a assegurar condições de realização, deslocamento e logística do ato, reforçando o compromisso do Governo do Brasil com políticas públicas orientadas pelas demandas históricas desse segmento da população.
MÚLTIPLAS GERAÇÕES – O encontro reuniu brasileiras de múltiplas gerações, territórios e realidades, além de mulheres afrodescendentes da diáspora e do continente africano. A programação começou às 8h, com concentração no Museu Nacional da República. Às 11h, a Marcha avançou pela Esplanada dos Ministérios em quatro trios elétricos que representaram as regiões brasileiras e o Comitê Global. A partir das 15h, atividades culturais e shows movimentaram a área externa do Museu, com apresentações de Larissa Luz, intérprete do jingle oficial “Mete marcha negona, rumo ao infinito”; Luana Hansen; Ebony; Prethaís; Célia Sampaio e Núbia. A programação completa da 2ª Marcha das Mulheres Negras e da Semana por Reparação e Bem Viver está disponível no site oficial do evento.
PAUTAS CENTRAIS – Nesta edição, a Marcha retorna a Brasília com pautas centrais como reparação histórica, enfrentamento à violência racial e de gênero, participação política, proteção dos territórios quilombolas, justiça ambiental e fortalecimento das comunidades tradicionais. A narrativa que orientou a mobilização destaca o Bem Viver como base para um novo modelo de sociedade, comprometido com dignidade, democracia real e superação do racismo estrutural.
POLÍTICAS FORTALECIDAS – A ministra Anielle ressaltou que, desde 2015, políticas estruturantes foram fortalecidas a partir das agendas apresentadas pelos movimentos negros. “Quando subimos ao trio, não lideramos a Marcha. Marchamos juntas. A democracia que queremos nasce do chão da luta, dos territórios, do cuidado e da estratégia das mulheres negras”, afirmou a ministra. Anielle destacou, ainda, avanços recentes, como o Programa Beatriz Nascimento, o fortalecimento das comunidades quilombolas, o reconhecimento de trancistas e mestres tradicionais, a ampliação de dados raciais e a Formação e Iniciativa Antirracistas (FIAR).
Foto: Bruno Peres/Agência Brasil







